Não interessa, já entrei. E no mesmo momento um casal rodopiou à minha frente, em completa felicidade. E a casa não estava abandonada, o chão não estava a cair. Vi as paredes forradas com o mais resplandecente papel de parede, o chão perfeitamente encerado e brilhante, móveis da mais fina madeira colocados nos sítios perfeitos, escolhidos cuidadosamente e ao detalhe com a atenção de quem viu naquela casa a oportunidade de uma vida feliz, bibelots delicados sobrepostos em naperons de maravilhosa qualidade levada a sério por mãos calejadas de anos a manejar agulhas próprias à linha n.º 6, n.º 12... Vi tapetes, do mais refinado gosto e em perfeita harmonia com as cortinas que se me assemelharam perfeitamente cuidadas em vez dos decrépitos trapos que neste momento jazem naquele sítio. E uma mesa, uma grande mesa.
Da mesma maneira que apareceu, o casal dá lugar a um grupo barulhento, alegre, inundado com a estonteante panóplia de sons, cores, vozes e risos característica de um grupo de amigos que sabem que é uns com os outros que poderão contar nos dias à frente e que são aquelas pessoas que terão valor na altura em que cometerem os mais incompreensíveis pecados públicos ou para sempre guardados no olhar do rapaz sardento que tenta esquecer o que fez enquanto sorri ao sentir o toque da pele dela, que ao seu lado tanto tempo nunca se apercebeu do que ele sente por ela. Há copos na mesa, copos vazios, cheios, meio cheios ou meio vazios. Há pratos com comida parcialmente devorada que mesmo assim se mantém apetecível. E cartas. As cartas que os que querem jogar sabem que nunca vão usar por causa daqueles que sabem que as suas capacidades mínimas vão ser claramente gozadas, situação que preferem evitar. Tudo brilha, tudo transmite excitação, delírio de alegria, paz e segurança. E depois viro-me.
Ouço vozes que conseguem de alguma maneira substituir os sons anteriores. São vozes ásperas e amargas, altas e exaltadas. Quase consigo sentir o medo da voz feminina quando me aproximo da porta ao meu lado direito, entreaberta e por onde escapa o aroma de um pequeno almoço preparado com o cuidado de quem se dedica à simetria da espessura da manteiga no pão torrado para evitar dedicar-se à constatação da impotência perante o desmoronar excruciantemente vagaroso da sua vida. Quase abro a porta e consigo vê-lo, a ele, de quem ela se afasta, ele, em quem ela já não confia, ele, de quem ela agora tem medo, ele, em quem ela agora não vê a pessoa que conhecia, ele, de quem foge com o medo de uma criança que foge daquele rufia que sabe que vai conseguir sentir-se superior quando a humilhar no intervalo. Passa por mim, não a correr, não a chorar. Já não consegue.
As cortinas a combinar com os tapetes, os naperons com os ostentosos bibelots. Já nada faz sentido. Quando quase embarra contra mim, posso ver os olhos dela. Já não brilham. Nem medo são agora capazes de mostrar. Só consigo ver a apatia de quem já não espera nada da vida, de quem se resignou da melhor maneira que pôde ao futuro que se tornou num presente demasiado previsível e sem truques na manga para a fazerem sorrir. A ausência de reacção de quem sabe que, por mais que lute, por mais que tente mudar o que vive agora, nunca vai conseguir nada, porque aquilo por que lutou, aquilo por que abdicou de tanta coisa, já não vale a pena. Atravessa a sala. Até ao canto da casa onde é só ela e está sozinha num mundo em que realmente consegue ter controlo sobre alguma coisa. Deixa a pele sentir os raios de sol e fecha os olhos. Uma lágrima cai.
Foi isto que vi. Foi isto que aconteceu?
Taken: 08.04.2007 Olimpus C-500
4 comments:
ate te podia meter aki uma dakelas frases "pré feitas" que s mandam para os telemoveis para dizer k adorei msm msm o teu texto, mas prefiro dizer coisas sem nexo e com erros ortograficos e deixar as frases com sentido para seres tu a escrever, pk sim, to a ver k temos aki escritora =) so tenho a dizer k s algum dia escrevers um best seller k eu kero cá uma comissao :p toda esta conversa toda so pa dizer k amei o texto :D ( e k fui a primeira a commentar) hihihihi
nao deixo.
um dia vai um senhor madeirense a um stand de automoveis, e diz "qué comprá um carre"
e o vendedor "sim, que carro quer?"
e ele "ni san"
dvc,.xmvxcvsd
:(
é um texto triste
:(
:´(
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